terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Geografias do Oriente Médio e Desinformação do Mundo

Como geógrafo, me senti na obrigação de pensar no que ocorre no Oriente Médio. Não que os geógrafos sejam obrigados a conhecer aquela região, ou a pensa-la, em todas as suas contradições. Pelo contrário, os cursos de geografia, de modo geral, tratam, quando tratam, de modo bastante superficial, e insuficiente, questões complexas do mundo contemporâneo. Daí, pobre é a formação dos alunos desses cursos para opinarem, de forma consistente, coerente e crítica, sobre quaisquer temas que resultem desta complexidade contemporânea em que vivemos. Não falo que nada dizem. Excluí os discursos militantes, apaixonados e, por isso mesmo, muitas vezes, cegos e vazios.

Mas, voltemos ao tema deste post. Parece que alguns elementos-chave estão presentes nas questões sobre o Oriente Médio. Pela primeira vez, em muito tempo, não vemos a grande mídia noticiar sobre Irã, Israel ou o Líbano isoladamente, países mais frequentes nas pautas midiáticas. Estão sob os holofotes agora outros territórios dos quais pouco se conhece, com alguma profundidade. Bahrein? Líbia? Tunísia? O que sabemos, nós, os tupinquins, desses lugares e povos seculares? Além é claro daquela bagagem bem senso-comum: petróleo, guerras, conflitos religiosos.

É claro que nossa desinformação não é culpa, apenas, dos cursos ruins de geografia que frequentamos. Ou dos totalitarismos na lida com a informação, bastante característicos da mídia nacional e estrangeira que fazem a nossa cabeça.




Me recordo de uma passagem da obra de Sartre que nos diz que "nós também somos responsáveis por aquilo que o mundo fez de nós". Se somos bárbaros, incultos, ignorantes em relação ao Oriente Médio, e toda complexidade que lá reina, também temos nossa parcela nisso. É preciso se informar, mais e melhor, do que, apenas, pela televisão, para formular uma hipótese que seja, ou ter uma opinião e pensamento mais profundos, sobre uma determinada formação territorial. É preciso, também, aprender a questionar os discursos hegemônicos.

Apenas um exemplo do modo como a mídia possui pouco rigor, alterando o discurso ao sabor de interesses obscuros: é interessante como o discurso sobre um determinado chefe de Estado varia se o "líder" possui interesses próximos, por exemplo, daqueles dos EUA. Mubarak, por muito tempo, fora chamado de "presidente", ao passo que outras nações não tão simpáticas assim aos estadunidenses, são tratadas, desde sempre, como paisinhos controlados pelas mãos de ferro de tiranos e ditadores. Não que esses "líderes" tenham práticas semelhantes àquelas dos líderes das democracias de mercado ocidentais, não é isso. Mas, é preciso cautela ao tratar de realidades distantes, que desconhecemos com espantosa profundidade, para não alimentarmos outros preconceitos, além daqueles difundidos pela grande mídia.

Irei me debruçar mais e melhor sobre essas questões que envolvem tanto a guerra da informação, quanto às mudanças que, sabemos, têm ocorrido em diversos países localizados desde o Norte da África até o Oriente Médio.

Um primeiro esforço de método que fiz envolveu buscar categorias de análise para auxiliar a construção de um pensamento mais profundo. Alguns eixos que podem ser explorados: a formação dos territórios nacionais (formações socioespaciais); os motores e interesses que provocam e alimentam as guerras e, por fim, os fermentos das revoluções surgidos de um mundo profundamente desigual, além dos interesses das agências de notícias na divulgação de informações a partir de um determinado ponto de vista particular. 

Tenho buscado textos de alguns pensadores de maior respeito para me ajudarem nesta tarefa. Portanto, logo mais, retornarei a este tema. Aliás, as questões da Geopolítica mundial, principalmente aquelas do Oriente Médio, foram as primeiras a me motivarem a ingressar em um curso de graduação em Geografia. Um dia, talvez, eu me anime a contar aqui esta história...

Para concluir, gostaria de deixar de presente para aqueles que tiveram disciplina e paciência para ler até aqui, uma preciosidade que encontrei - o genial Eça de Queiroz tratando da inevitabilidade das revoluções. Lá vai:

A Inevitabilidade das Revoluções
As revoluções não são factos que se aplaudam ou que se condenem. Havia nisso o mesmo absurdo que em aplaudir ou condenar as evoluções do Sol. São factos fatais. Têm de vir. De cada vez que vêm é sinal de que o homem vai alcançar mais uma liberdade, mais um direito, mais uma felicidade. Decerto que os horrores da revolução são medonhos, decerto que tudo o que é vital nas sociedades, a família, o trabalho, a educação, sofrem dolorosamente com a passagem dessa trovoada humana. Mas as misérias que se sofrem com as opressões, com os maus regímens, com as tiranias, são maiores ainda. As mulheres assassinadas no estado de prenhez e esmagadas com pedras, quando foi da revolução de 93, é uma coisa horrível; mas as mulheres, as crianças, os velhos morrendo de frio e de fome, aos milhares nas ruas, nos Invernos de 80 a 86, por culpa do Estado, e dos tributos e das finanças perdidas, e da fome e da morte da agricultura, é pior ainda. As desgraças das revoluções são dolorosas fatalidades, as desgraças dos maus governos são dolorosas infâmias.
Eça de Queirós, in 'Distrito de Évora'

2 comentários:

  1. Valeu James, tá muito bom o formato e organização do blog. Aliás tratar de geografia é sempre algo bom. Hj, por exemplo, três alunos de 3 ano do EM.me falaram com os olhos brilhantes que vão fazer Geografia. Isso nos orgulha e nos deixa cada vez mais certos de que essa ciência é talvez a que melhor possui as ferramentas para explicar as adversidades do mundo atual . Parabéns pelo blog. Barrinha

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  2. Caro Edgar, sou suspeito para falar da Geografia, pois acho nossa ciência apaixonante, e capaz de abrir nossa cabeça! È mesmo muito gratificante ouvir de um aluno que irá fazer faculdade de Geografia...é quando percebemos, por faze-los enchergar o mundo de outro jeito, como esse encantamento do mundo, que podemos fazer com que chegue ao outro, pode ser transformador!
    Obrigado pela visita,
    Um abraço,
    James

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